Diferentemente de outras análises, para os Yanomami os sonhos podem influenciar a vida coletiva
Os ameríndios têm uma percepção diferente do que afirmam alguns pesquisadores, como Freud, por exemplo.
Desde os anos 1990, os estudos antropológicos sobre os sonhos se destacam. Além disso, novas descobertas sobre os povos ameríndios surgiram, como a interpretação dos sonhos pelos Yanomami. Para essa etnia indígena, os sonhos afetam diretamente as ações no coletivo.
Sonho Yanomami reflete o dia a dia da comunidade
De acordo com a psicanálise, os sonhos são gerados pelo inconsciente psíquico individual. Porém, a interpretação de sonhos pelos Yanomami foge desse conceito. Para eles, os acontecimentos dos sonhos são reais. Sobre isso, o antropólogo Renato Sztutman comentou:
“A vida acordada e a sonhada apresentam a mesma importância para povos ameríndios. Pesquisas recentes procuram refletir sobre os sonhos como acontecimentos repletos de consequências também para a vigília.”
Embora não exista nos bancos de pesquisas muitos estudos etnográficos sobre o universo onírico, Sztutman, pesquisador da Universidade de São Paulo, faz parte do grupo responsável pela publicação do dossiê a respeito dos sonhos Yanomami, na Revista de Antropologia.
Há uma mudança significativa no interesse dos pesquisadores na temática. Novas análises sobre as atividades oníricas, assim como discussões sobre mitologia e xamanismo. Nesse contexto, algo que já era abordado por Freud em seus estudos, com os quais ele concluiu que os sonhos são as realizações de desejos reprimidos.
Sztutman reforça que, para os indígenas, as atividades oníricas vão além dos desejos, para eles os sonhos como caminhos para chegar a realidades inacessíveis durante a vigília.
Um estudo desenvolvido pela antropóloga Hanna Limulja e publicado em 2019 analisou mais de 100 relatos dos sonhos, com auxílio do xamã e líder Davi Kopenawa.
Os participantes eram da comunidade Pya ú na região Toototopi. Os resultados revelam que os sonhos são uma forma de ver o invisível e que, ao dormir, o corpo permanece no espaço, mas uma espécie de imagem vital percorrer lugares diferentes.
De acordo com a pesquisadora,
“Os yanomami sabem que o que vivenciam em sonhos é diferente do que o que experimentam em estado de vigília. No entanto, aquilo que experimentamos sonhando é considerado tão importante quanto as experiências da vida desperta. São formas complementares de estar no mundo e de se relacionar com ele.”
Esse é o principal fato que distancia a interpretação dos sonhos deles, pois os brancos sonham apenas consigo mesmos.
Ou seja, eles refletem os desejos dos outros e a necessidade da comunidade, diferente do afirmado por Freud, assim como é uma forma de visitar novos lugares o que também é analisado pela antropóloga francesa Nastassja Martin.