Conheça ‘O Rei da TV’, a icônica série sobre Silvio Santos

Justamente pelo fato de ser 'não autorizada' é que a série do Star+ se destaca ao recriar a fascinante história de Silvio, isso sem poupar sua figura de críticas e polêmicas.

Série do Star+ sobre Silvio Santos diverte o público com atuações excelentes e um roteiro ousado. É estranho pensar que Silvio Santos levou tanto tempo para ter sua história contada no audiovisual. Aos seus 91 anos de idade e com quase sete décadas de vida pública, o dono do SBT ganhou uma biografia, apropriadamente em formato televisivo, com “O Rei da TV“.

E é justamente pelo fato “não autorizado” que a série do Star+ brilha ao recriar a fascinante história de Abravanel sem poupar sua figura de críticas e polêmicas.

José Rubens Chachá, Mariano Mattos Martins e Guilherme Reis vivem Senor e Silvio em sua maturidade, início de sucesso e infância, respectivamente, sendo que os três conseguem balancear com muita sensibilidade suas próprias características artísticas e as marcas caricatas do emblemático apresentador e empresário.

Existe até uma certa ousadia na ideia de fugir tanto da imitação de Silvio quanto faz “O Rei da TV”, mas a decisão se torna um acerto justamente porque o trio nunca permite que uma ou outra marca do padrão de fala icônico do apresentador desapareça por completo. Dessa forma, “O Rei da TV” não revela grandes novidades sobre a vida de Silvio, mas analisa e correlaciona momentos históricos já bem midiatizados sobre não só sua persona de palco, mas, também, o homem que a criou: o Senor Abravanel.

São três as passagens-chave da série, começando por quando ele era jovem e trabalhava como camelô no Rio de Janeiro dos anos 1950; o sucesso inicial na TV dos anos 1960 veio acompanhado da negligência com sua primeira esposa e uma crise de saúde quase o fez perder a voz, em 1988.

Admiradores do “folclore SBT” vão se deleitar com as diversas referências e piadas trazidas pelo roteiro. Como exemplo, podemos citar os aviõezinhos de dinheiro, as músicas, as figuras marcantes, como Roque, Pedro de Lara e Sérgio Mallandro, e até o infame momento “e o bambu?”.

Mas nem só de reverência vive “O Rei da TV”, pois, na série, Silvio alterna momentos de fiel carinho e consideração pelo público e pela família, com ataques de fúria pelo temor de ser passado para trás em sua própria emissora.

O lado obscuro dos negócios é abordado na forma de personagens fictícios, como o malandro Stanislau (Leandro Ramos, do “Choque de Cultura”), mas não poupa nem figuras reais (ainda vivas hoje em dia), como a TV Globo e as personas do poderoso Roberto Marinho e um certo Rossi (João Campos/Celso Frateschi), representação óbvia e clara do empresário Boni.

A direção de Marcus Baldini e equipe traz todo o espírito da TV aberta dos anos 1980, além de mostrar criativas e surreais sequências nas quais Silvio conversa consigo mesmo, sendo retratado visualmente em programas da própria emissora.

Em uma divagação sobre a integridade do “Baú da Felicidade”, por exemplo, Silvio escapa para uma fábula perturbadora em que uma criança discute com a Vovó Mafalda sobre fraude. Quando começa a pensar em sua própria destruição, ele é visitado por visões do banco do humorístico “A Praça É Nossa”, por um conflito com a personagem da Velha Surda e por uma bizarra recriação das pragas bíblicas do Egito.

Quando Silvio enfim precisa enfrentar seus erros, é forçado a confrontar fantasmas do passado reencarnados à sua frente, ora em um baú de metal em lenta inundação, ora em uma sala de cirurgias abandonada.

Devido a tantos acontecimentos, a série optou tratar a complexidade de Silvio Santos para além das ações surrealistas e que flertam com tons e gêneros, destoantes aos propostos inicialmente pela produção.

Artistas muito talentosos fazem parte do elenco, como Leona Cavalli, Leandro Ramos, Larissa Nunes, Cássia Damasceno e Emílio de Mello chegam fazendo frente à grandiosidade de Senor e Silvio como figuras que motivam amor e ódio pelo apresentador, além dos sentimentos também vindos dele.

Nesse contexto, Roberta Gualda interpreta Cidinha, que foi a primeira esposa de Silvio, e rouba a cena como alicerce dramático de um efeito reflexivo. Além dela, temos os atores que fizeram participações menores, mas tornando inesquecíveis alguns retratos de figuras históricas: da dobradinha entre João Campos e Celso Frateschi como Rossi (versão da série para o poderoso Boni, da Rede Globo), Paulo Nigro, como Gugu, e Pascoal da Conceição (o inesquecível Dr. Pompeu Pompilho Pomposo) como Roberto Marinho.

Vale ressaltar a impressionante caracterização e os trejeitos de Chachá como apresentador. Do lábio inferior avantajado a quase imperceptíveis movimentos corporais, o ator assume o espírito do personagem, segurando a peteca de mostrar um lado vulnerável praticamente nunca visto pelo público.

Nota-se que “O Rei da TV” não se preocupou com um retrato totalmente fiel de Silvio Santos, ainda que tenha tido a audácia de explorar cantos mais sombrios da personalidade do apresentador. Dessa maneira, a série faz melhor algo que seu objeto de análise sempre tentou: ainda que com muitas falhas, nunca deixa sua eventual megalomania atrapalhar a diversão do público.

E, por fim, talvez isso seja mesmo suficiente, já que há um bom motivo para o homem ser, até hoje, com seus 91 anos de idade, um dos rostos mais famosos da televisão brasileira.

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